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Biólogo flagra morcego-vampiro em cloaca de galinha

Registro ocorreu em Peruíbe (SP); duas das três espécies de morcegos que se alimentam de sangue têm preferência por aves.

Por Fernanda Machado, Terra da Gente



Por vários dias pela manhã o biólogo Bruno Lourenço se deparava com vestígios de sangue próximo ao dormitório das galinhas na chácara da avó em Peruíbe (SP). Curioso para descobrir do que se tratava, ele resolveu ficar de plantão por uma noite. Depois de uma hora de espera, a surpresa: era um morcego-vampiro se alimentando do sangue da cloaca de uma das galinhas.

“Primeiro eu comecei a procurar por machucados nos animais. Eu imaginava que podia ser morcego, mas queria ter certeza. Não perdemos nenhuma galinha, mas serviu de alerta. Depois do registro eu enviei o vídeo para o Ed Ventura, biólogo e coordenador do Instituto Bioventura, que trabalha com morcegos. Analisamos juntos e decidimos orientar os donos de propriedades da região a prenderem as galinhas nos galinheiros. É um registro importante, porque contribui com a ciência e com a educação ambiental”, conta Bruno.

Ed desenvolve um projeto no Instituto com morcegos que visa a coleta de amostras para análise da microbiota oral e resistência bacteriana na região da Juréia-Itatins – uma parceria entre Universidade Metropolitana de Santos (Unimes) e Intituto de Ciências Biomédicas ICB-USP.

“O objetivo da pesquisa é analisar as bactérias que nós seres humanos compartilhamos com os morcegos em razão da aproximação aos ambientes que vivem e identificar alguma bactéria que seja resistente a antimicrobianos”, diz Ed Ventura, que também atua como guia de ecoturismo.

O pesquisador reforça que os morcegos são bioindicadores do meio ambiente e, portanto, extremamente importantes para o equilíbrio ecológico. O Instituto Bioventura é uma ONG criada para conservação da fauna silvestre da Mata Atlântica.

As três espécies de morcegos-vampiros ocorrem no Brasil: Diphylla ecaudata, Desmodus rotundus e Diaemus youngi (da esq. para dir.) — Foto: Roberto Novaes

As espécies

Você já descobriu no Terra da Gente que o Brasil tem mais de 180 espécies de morcegos e que apenas três se alimentam de sangue: morcego-vampiro-comum (Desmodus rotundus), morcego-vampiro-de-asas-brancas (Diaemus youngi) e morcego-vampiro-de-pernas-peludas (Diphylla ecaudata). Eles são morcegos hematófagos, também chamados popularmente de morcegos-vampiros.

De acordo com o biólogo especialista em morcegos, Roberto Leonan Novaes, duas dessas espécies, Diphylla ecaudata e Diaemus youngi, têm preferência por aves, mas há relatos de que elas também se alimentam de sangue de mamíferos. Já o Desmodus rotundus pode se alimentar do sangue de diversos animais, incluindo as aves.

Ele explica que não é possível identificar a espécie só pelo vídeo, porque os três morcegos-vampiros são aproximadamente do mesmo tamanho e possuem a mesma coloração de pelagem. “Essas três espécies estão presentes em todo o Brasil, mas o morcego-vampiro-comum é o mais abundante. Ele tolera ambientes muito alterados pela ação humana, incluindo áreas rurais e periurbanas. As outras duas espécies são menos tolerantes, por isso costumam ocorrer em florestas e áreas bem conservadas. Além disso, elas também possuem densidades populacionais naturalmente mais baixas e, por isso, podem ser consideradas mais raras”.

Os morcegos-vampiros têm hábitos noturnos — Foto: Guilherme Garbino

Registro curioso

Segundo o biólogo Roberto Leonan Novaes, em geral, não há risco de se perder o animal porque esses morcegos consomem uma pequena quantidade de sangue a cada noite, normalmente não mais que 30 ml de sangue.

O que acontece é que esses morcegos podem acabar voltando para se alimentar do sangue do mesmo animal durante várias noites consecutivas e isso pode acabar trazendo problemas de saúde. Além disso, o mesmo animal pode ser parasitado por inúmeros morcegos numa mesma noite. “Em galinhas, por exemplo, já foi relatada a morte após vários dias seguidos sendo parasitadas por esses morcegos”, lembra.

“Os morcegos costumam procurar por áreas que tem pele exposta e que possam ser mais vascularizadas. É mais fácil para pegar um vaso sanguíneo e estimular o sangramento pleno. Normalmente os morcegos vão direto nas pernas, na crista e, sobretudo, na cloaca da galinha, porque é mais fácil deles conseguirem se agarrar nas penas e a ave não conseguir bicar”, explica Roberto.

Questionado se existe um incômodo no animal que está servindo de alimento para o morcego, o especialista explica que é feita uma incisão muito pequena na pele e que o sangue verte, porque os morcegos possuem uma enzima na saliva chamada Draculina que é um anticoagulante poderoso. “Mesmo que possa incomodar, isso acontece durante a noite e as galinhas não possuem capacidade visual no escuro, então é muito difícil elas conseguirem se deslocar”.

De acordo com o biólogo Bruno Lourenço, autor do registro em vídeo, o morcego sempre atacava as galinhas no mesmo horário, entre 20h e 21h. Roberto explica que essa condição é muito própria dos morcegos hematófagos, já que eles saem para buscam alimento um pouco mais tarde que as espécies insetívoras e frugívoras.

“Os morcegos-vampiros preferem sair quando a noite já está bem escura, evitando locais claros, incluindo as áreas abertas muito iluminadas pela lua. Ou seja, se for em um período de lua nova, com noite bem escura, eles podem sair para buscar comida mais cedo. Mas em noites de lua cheia, que são mais claras, eles optam por períodos em que a lua esteja mais baixa, obscurecida pela vegetação ou obstruída por algum outro fator”

Os morcegos costumam manter um comportamento padronizado. Se eles conseguem se alimentar de um animal que está sempre no mesmo local e em um determinado horário, eles vão repetir isso por dias. “É uma forma inteligente de garantir comida com um menor custo energético”, conclui Roberto.

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