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Por Celso Alonso - Satélite Notícias
BRASÍLIA - O episódio envolvendo a prisão de Filipe Martins, ex-assessor internacional de Jair Bolsonaro, já vinha provocando tensões no âmbito jurídico e político. Nos últimos dias, no entanto, ganhou um elemento explosivo: autoridades dos Estados Unidos afirmaram que o dado utilizado para justificar sua prisão — um suposto registro de entrada nos EUA em 30 de dezembro de 2022 — não corresponde à realidade. Em outras palavras: teria sido usado um documento falso ou alterado indevidamente para legitimar medidas judiciais no Brasil.
Nesta sexta-feira (10.out.2025), o órgão dos EUA CBP (Customs and Border Protection) divulgou nota afirmando que, após revisão dos registros migratórios, “foi determinado que o Sr. Martins não entrou nos Estados Unidos nessa data”. A nota diz ainda que “o ministro Alexandre de Moraes citou um registro incorreto para justificar a prisão prolongada do sr. Martins” e que a inserção desse dado “impreciso” nos sistemas da CBP está sendo investigada.
A CBP reforça a condenação ao uso indevido desta entrada falsa como fundamento de condenação ou prisão e afirma seu compromisso com integridade nos registros fronteiriços.
A repercussão internacional é inevitável. "O governo dos EUA rechaça a narrativa utilizada no Brasil e coloca em xeque a credibilidade da construção legal que levou ao encarceramento de Martins."
A defesa de Martins vinha apresentando desde antes divergências importantes sobre o registro: apontava erros na grafia do nome, uso de passaporte cancelado, inconsistências nos dados migratórios e deslocamentos comprovados no Brasil em dezembro de 2022.
Em agosto de 2025, o advogado Jeffrey Chiquini divulgou que teria obtido documentos indicando que os registros originais foram preservados e que um “registro fraudulento” teria sido inserido em 2024, enquanto Martins já estava sob custódia. Ele prometeu revelar quem pode ser responsabilizado criminalmente por tal alteração retroativa.
Não é apenas no plano jurídico interno que essa disputa ocorre. Nos EUA foi marcada uma audiência, em abril de 2025 em Orlando, para examinar a “suposta fraude” nos registros migratórios usados no caso. Ou seja: as investigações transcendem as fronteiras do Brasil.
Além disso, a nota da CBP afirma que investiga como o registro “incorreto” foi incluído em seus sistemas, o que inclui apuração interna da própria agência americana para evitar que “futuras discrepâncias ocorram”.
Crimes federais e penas pesadas
Juristas americanos ouvidos pela imprensa ressaltam que, diante das revelações da CBP, Alexandre de Moraes e eventuais envolvidos na utilização do registro falso poderão ser acusados de crimes federais nos Estados Unidos, como fraude documental e obstrução de justiça internacional. A depender do enquadramento, as penas previstas na legislação norte-americana variam de 4 anos de reclusão até prisão perpétua, em casos considerados de maior gravidade.
Em caso de eventual condenação pela Justiça norte-americana, a Interpol poderá ser acionada para emitir alertas vermelhos contra Moraes e demais envolvidos. Isso significa que, caso deixem o território brasileiro, os supostos condenados poderão ser detidos em qualquer país que mantenha cooperação ativa com os Estados Unidos, ampliando de forma significativa o risco de prisão internacional fora do Brasil.
O que está em jogo (e os riscos do caso)
Credibilidade institucional
Se for comprovado que a prisão de Martins foi sustentada por documento falso, toda a construção do processo — e, por extensão, decisões do STF que o envolvem — pode ficar sob suspeita. A autoridade judicial poderá sofrer desgaste institucional grave.
Responsabilidades criminais ou disciplinares
A defesa já sugere que Moraes possa responder criminalmente nos EUA pelo uso do documento falso. Além disso, se comprovado que houve manipulação, poderá haver responsabilização no Brasil — até mesmo no âmbito do STF e do Conselho Nacional de Justiça.
Efeitos legais para Martins
Martins já cumpriu meses de prisão preventiva com base nessa afirmação de viagem internacional que, segundo os EUA, nunca ocorreu. Se confirmado o erro, torna-se plausível pedido de reparação, anulação de atos processuais e revisão de todo o trajeto judicial.
Pressão diplomática e reação internacional
O fato de que um órgão externo (EUA) venha desmentir um dado-chave usado no Brasil coloca o país em posição vulnerável. Questionamentos sobre coerência institucional, respeito ao Estado de Direito e independência do judiciário ganharão corpo.
Precedente perigoso
Se casos futuros começarem a seguir o modelo de utilização de documentos imprecisos ou falsos para justificar prisões — sob o argumento de segurança ou terrorismo jurídico —, o precedente aberto por esse episódio pode servir como instrumento de abuso de poder.
O caso Filipe Martins, até agora, parecia ser mais um ponto de calor nas disputas entre forças políticas e poderes do Estado. Mas com a manifestação oficial da CBP nos EUA, a trama toma contornos de escândalo institucional. A acusação de uso de documento falso para sustentar prisão preventiva é grave, capaz de minar, se comprovada, a credibilidade do sistema judicial.
Em última instância, esse caso desafia premissas fundamentais: a legalidade, o devido processo, a integridade de provas e o respeito à presunção de inocência. E nos força a perguntar: se um Estado estrangeiro refuta o dado que embasa a prisão de um cidadão brasileiro, o que isso diz sobre a fragilidade dos controles internos?