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Alexandre de Moraes censura reportagens sobre acusações de ex de Lira

Depois do Twitter, Youtube também foi alvo de ordem para suprimir conteúdos sobre suspeitas de agressão e corrupção contra Lira

Por Rafael Moraes Moura — Brasília

O ministro do STF Alexandre de Moraes durante sessão da Primeira Turma da Corte — Foto: Gustavo Moreno/STF

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou nesta terça-feira (18) a retirada do ar de dois vídeos e duas matérias jornalísticas em que Jullyene Lins, ex-mulher do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o acusa de agressão física, estupro e de envolvimento em corrupção.

Os vídeos em questão foram divulgados pelos canais da Folha de S.Paulo e da Mídia Ninja no YouTube. As reportagens foram veiculadas pelo portal Terra e pelo Brasil de Fato. Na decisão, Moraes deu um prazo de duas horas para que a rede social e os veículos retirassem o conteúdo do ar, sob pena de multa diária de R$ 100 mil.

A supressão dos conteúdos foi um pedido da defesa de Lira, que já havia obtido de Moraes uma vitória anterior, na última quinta-feira (13), com a remoção de um perfil na rede social X que chamou o presidente da Câmara de “estuprador” em letras maiúsculas.

A postagem viralizou em meio à repercussão da aprovação do regime de urgência para o PL do Aborto, arquitetada pela bancada evangélica com o apoio de Lira. Moraes aplicou uma multa de R$ 700 mil ao X pela demora em bloquear a conta da usuária chamada Amandinha, além de determinar que a rede social fornecesse ao STF os dados cadastrais da internauta.

Para a defesa de Lira, há um “movimento orgânico, encadeado, de divulgação de notícia mentirosa” e “altamente ofensiva”, com o “claríssimo propósito de desestabilizar não apenas a figura política” do parlamentar, mas também de “atingir o exercício da elevada função da Presidência da Câmara dos Deputados”. Os advogados do presidente da Câmara falam em um "ecossistema de desinformação e desconstrução de imagens".

Na avaliação do ministro do STF, "não há, no ordenamento jurídico, direito absoluto à liberdade de expressão".

Pela nova decisão de Moraes, deve ser removido imediatamente do canal do jornal Folha de S.Paulo um vídeo que exibiu uma entrevista com a ex-mulher de Lira em 14 de janeiro de 2021 – quando o parlamentar estava em campanha para a presidência da Câmara. Lira foi eleito em primeiro turno com 302 votos um mês depois de a reportagem ser veiculada.

Na gravação de 16 minutos e 27 segundos, Julyenne diz que foi vítima de “violência psicológica” do ex-marido.

Na entrevista, a ex-mulher de Lira é questionada pela repórter Constança Rezende sobre os motivos de ter mudado de versão sobre a alegação de que teria sido agredida por ele em 2006. Em 2015, a Segunda Turma do STF absolveu o parlamentar ao concluir que não havia provas de que Julyenne tivesse sido, de fato, agredida pelo deputado.

“Ela teria inventado as agressões narradas por motivo de vingança”, disse à época o relator do caso, o ministro Teori Zavascki, ao defender o arquivamento do processo. A posição da Turma pela absolvição de Lira acompanhou o entendimento do Ministério Público.

Ao ser indagada pela Folha sobre a mudança de versão, Julyenne afirmou que foi ameaçada por Lira. O vídeo da Folha havia recebido 18,7 mil visualizações no YouTube até a noite desta terça-feira.

Além da gravação com a fala da ex-mulher de Lira, o canal divulgou na descrição do vídeo um posicionamento da defesa do deputado rechaçando as imputações, de forma a contemplar a versão do presidente da Câmara. Ainda assim, Moraes decidiu mandar tirar a peça do ar.

“A repetição e veiculação da falsa acusação, atrai a responsabilidade penal e cível não só de quem a pratica, mas também de quem a reproduz, ante a inequívoca ciência da sua falsidade", afirmou em nota o advogado de Lira à época, Fábio Ferrario.

Também foram alvo de Moraes um vídeo exibido pelo canal Mídia Ninja, de 7 de junho de 2023, e uma reportagem do portal Terra, de 17 de julho de 2023, em que a ex-mulher de Lira o acusa de estupro. “‘Me senti enojada, suja’”, diz a matéria.

Já o texto do Brasil de Fato, de junho do ano passado, trazia o título "Em entrevista, ex-esposa afirma que foi vítima de violência sexual cometida por Arthur Lira".

No vídeo exibido no canal Mídia Ninja, com 453,9 mil visualizações até a noite de terça-feira, a chamada é “Bomba no Arthur Lira. Sua ex-esposa, Jullyene Lins, conta tudo sobre as malas de dinheiro”, em relação a um suposto esquema de desvio de dinheiro público em Alagoas. Lira foi absolvido nesse caso pelo Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL).

Já os textos do Terra e do Brasil de Fato resumem o teor de uma reportagem veiculada pela Agência Pública em junho do ano passado, quando Jullyene falou pela primeira vez que Lira a teria violentado sexualmente.

No ano passado, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal mandou retirar do ar a reportagem original da Agência Pública com o depoimento de Julyenne – e, em março deste ano, Moraes manteve o texto removido.

É no âmbito dessa ação no Supremo que Lira vem entrando com os pedidos para remover do ambiente virtual conteúdos que reproduzam declarações da ex-mulher.

Lira, no entanto, não é oficialmente parte do processo – uma reclamação da Agência Pública contra a decisão da Justiça brasiliense.

Segundo relatos obtidos pela equipe da coluna, Lira se irritou com as críticas que sofreu nas ruas e principalmente nas redes por conta da aprovação do regime de urgência ao PL do Aborto, que acabaram trazendo à tona declarações antigas da sua ex-mulher.

Além das matérias jornalísticas, o presidente da Câmara também pediu e conseguiu do STF a remoção de 10 postagens feitas por internautas no X que abordavam o assunto.

Na noite de ontem, o presidente da Câmara anunciou que vai criar um grupo de trabalho para tratar do projeto de lei do deputado evangélico Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) “sem pressa ou qualquer tipo de açodamento”, no segundo semestre deste ano. O projeto prevê que uma mulher estuprada pode ter pena superior ao seu estuprador.

Na prática, Lira recuou na análise da matéria, após a mobilização de ativistas de direitos humanos, parlamentares do campo progressista e até de críticas de integrantes do governo Lula, que havia permanecido inerte inicialmente.

Procurado pela equipe da coluna, o YouTube informou que não comentaria o assunto. O Twitter não respondeu ao blog, mas a coluna apurou que a plataforma já recorreu das decisões do ministro.

Já a defesa de Lira alegou que não se manifestaria porque o caso está sob “segredo de Justiça”.

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